Debaixo da capa do Luís e do Arturas - Under The Cover

1/23/2017

Estive à conversa com o Luís Cunha e Arturas Slidziauskas, não só porque sou fã da sua loja - para quem já conhece e também é gosta deste tipo de publicações, é difícil também não ficar - mas porque percebi que este cantinho sai fora do que os define, no papel oficial, como profissionais. “Nós gostamos de design e de coisas bonitas e pensámos fazer algo dentro do que nós gostamos e talvez pudesse agradar também a mais pessoas”, explicava-me o Arturas enquanto atravessávamos a Gulbekian.



Depois de algumas visitas à loja, percebi que tinha de lá voltar não como cliente, mas sim como alguém que queria ouvir o porquê deste negócio. Ambos são da àrea da saúde - o Luís de Veterinária e o Arturas de Medicina - e abriram a Under the Cover, uma bookshop em Lisboa.
Encontrar um nicho. Encontrar algo de que se gosta - o muito ou o pouco talvez pouco importe - e fazer disso um negócio. Ou como o próprio Luís o disse, "quando é o teu bebé", talvez a melhor forma de fazeres um negócio é meteres mesmo paixão no que fazes.

“Quando é um projecto teu e é um sonho que estás a colocar em prática, tens um grande potencial. Neste caso vejo o potencial de ajudar criativos, pessoas que precisam disto como inspiração e que a partir daí criam coisas fenomenais. Tens ao mesmo tempo a possibilidade de mudar um bocadinho a vida das pessoas, ajudar a melhorar o meio artístico e ainda ti próprio a nível de realização pessoal e profissional”.


 
               



Sabiam já há algum tempo que queriam ver uma ideia própria traduzida em negócio. Muitos interesses e gostos, acabaram por colocar o seu investimento em algo que em nada, à partida, está relacionado com as suas àreas de formação. “É bom podermos exercer o nosso trabalho mas apetece por vezes distrair um bocadinho, porque faz bem arejar a cabeça. O trabalho exige resolver problemas e lidar diariamente com pessoas que têm problemas muito sérios”.


É por esta razão que os quis destacar num EP. Porque cada vez mais acho que temos de nos desprender das amarras do nosso vínculo académico. Eu mesma sempre me agarrei a ele, não por um de "foi o canudo que tirei, é este canudo onde vou trabalhar" mas sim porque sempre fiquei com a sensação de que a sociedade não o via com os melhores olhos.

“Antes de abrir este projecto sentimos dificuldade em encontrar revistas que já gostávamos mas também de descobrir novas e eu acho que conseguimos oferecer as duas coisas. Podias perguntar-me ‘Ah mas para quem estava antes a trabalhar na área da saúde e agora tens uma loja de revistas... isso deixa-te mais realizado? Sim!”, contava o Luís com um brilhozinho nos olhos.


Mesmo que sejamos licenciados numa determinada àrea (ou seja qual for o grau académico ou escolar) , não quer dizer que não possamos vir a trabalhar noutra àrea qualquer. Aliás, a meu ver isso só pode ser positivo. Temos o dilema do "então mas assim nunca irás ser specialist em nada". Pode ser verdade, uma carreira sólida numa determinada àrea demora muito tempo a cimentar. Por outro lado, se o fizermos iremos ganhar outro tipo de bagagem. Na minha opinião, ambas as escolhas irão recolher frutos. O facto de sairmos da nossa zona de conforto e nos desafiarmos para além do que no diploma nos qualifica, permite-nos evoluir, contactar com vários tipos de pessoas que têm diferentes tipos de interesses. Isso só pode contribuir para o nosso crescimento pessoal, para sairmos da nossa bolha e do que está oficialmente convencionado.

“Li um estudo de um país nórdico, em que eles aconselhavam e determinaram mesmo que, a cada 4 ou 5 anos, as pessoas deviam mudar radicalmente a area de trabalho. Até porque nos mantém produtivos porque estar numa àrea em que não estás tão à vontade incita-te a estudar e a trabalhar mais, a passar os teus limites. Quando ficas numa area anos seguidos, acabas por estagnar e por mais que gostes do que faças, cansas-te. Não precisas também de mudar de área, podes fazer algo diferente mas acho mesmo que precisas de te desafiar um bocadinho. Se estás 100% confortável talvez não seja bom. A insegurança e a dúvida quebra a monotonia e faz-te avançar”, explicava o Luís, confiante da escolha que fez.



Acredito que cada um de nós tem algo que realmente gosta de fazer ou que sente que até tem jeito para. Mas muitas vezes somos travados não só por quem nos rodeia mas por nós mesmos. E porquê? Porque é uma ideia, porque é um gosto pessoal, como é que isso pode dar dinheiro? Pode da mesma forma que a loja, que nasceu de interesses e gostos de duas pessoas, hoje dá dinheiro. A diferença é o gosto com que fazemos as coisas, o que não nos importamos de sacrificar, o tempo que dedicamos. Quando nos empenhamos em algo que realmente nos dá gozo e em que acreditamos, a dedicação que colocamos em cima vai ser tão grande que inevitavelmente algum tipo de retorno irá ter.

Que sirva de inspiração a quem tem um sonho e que ainda não deu o salto por ter um diploma em casa que o puxa para trás.


O Luís e o Arturas são sócios e donos da Under The Cover. O Arturas veio da Lituânia estudar para Coimbra em Erasmus e continua a exercer Medicina. O Luís está agora a tempo inteiro na bookshop.
A loja que só por si já parece uma galeria de arte, com todas as edições expostas num ambiente minimalista, irei mostrar num post apenas dedicado a ela.


Obrigada ao Luís e ao Arturas por serem sempre tão queridos a receber e pela conversa a um Sábado de manhã, com muito sol e frio à mistura.

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