DE CÁ, PARA LÁ #7: A DIANA, HAMBURGO

4/03/2017


Olá Mundo! Já lá vão quase 5 anos desde que as minhas manhãs são a acordar numa cidade escura e fria bem diferente daquela que me viu crescer. Dias diferentes, novos desafios e novas rotinas... uma nova realidade que me permitiu evoluir em várias direcções… O meu nome é Diana, tenho 27 anos e estou a fazer o meu doutoramento em bioquímica em Hamburgo, na Alemanha.

● Sair do país

O início de uma aventura…
Desde que me lembro que sempre disse que não queria estudar para além da licenciatura. Certo dia, com 22 anos de idade, dou por mim a procurar no mapa onde ficava Hamburgo: a cidade onde se localiza o instituto para o qual me estava a candidatar para fazer um doutoramento. A verdade é que me apaixonei por ciência durante os meus estudos e decidi seguir um caminho rumo a uma carreira científica. Sempre fui ambiciosa e por isso procurei as melhores oportunidades. Em Portugal? Existiam bastantes certamente. Mas, no entanto, o melhor estava fora e por isso a minha aventura como emigrante estava destinada a começar. Com o máximo apoio da minha família fiz as malas e vi o avião levantar voo sobre a minha bela cidade de Lisboa. O coração estava partido, as lágrimas escoriam-me pela face e o sentimento amargo da despedida fundia-se com o entusiasmo do início de uma nova aventura.

Oportunidades lá fora…
O EMBL, Laboratório Europeu de Biologia Molecular, é um dos melhores laboratórios de investigação científica na área das ciências naturais a nível europeu e até mesmo mundial. O objectivo? Estudar proteínas que estão envolvidas no processo de infecção da bactéria que causa a doença infecciosa Tuberculose. O projecto era bastante aliciante e desafiador, mas a preparação que recebi em Portugal na minha licenciatura e mestrado foi excelente e permitiu-me ter sucesso para avançar num caminho bastante promissor. No início do meu doutoramento tive um curso de 3 meses organizado para todos os 60 alunos que iniciaram o seu percurso no mesmo ano que eu. Foi uma oportunidade fantástica para conhecer a ciência que se faz no instituto e também os indivíduos que o fazem.


Para além de todas as técnicas e instrumentação inovadoras, às quais não teria acesso em Portugal, tive também várias oportunidades para aprender com cientistas de nome dentro e fora do EMBL. Não me vou esquecer do dia em que ouvi uma apresentação inspiradora de Ada Yonath, vencedora de um prémio nobel, das várias apresentações no instituto e das viagens pelo Mundo rumo a conferências internacionais. Por exemplo, tive a oportunidade e a honra de viajar para Keystone, nos Estados Unidos, para apresentar o meu trabalho a cientistas de todo o mundo. Tive também a oportunidade de participar no “Roche Continents”, um evento magnífico organizado em Salzburgo pela farmacêutica Roche para cientistas e artistas com o objectivo de promover a criatividade. Para além de tudo isto também tive a oportunidade de estar envolvida na organização de conferências. Tudo isto me fez crescer imenso a nível profissional mas também pessoal. Todos os dias me vejo exposta a novas ideias e criticas construtivas que me fazem desenvolver o raciocínio e até mesmo pensar “fora da caixa”. Teria evoluído assim se tivesse ficado em Portugal? Não creio.



● O eu de agora e o eu de quando estavas em Portugal

Viajar… o que há de melhor? 
Para além das viagens por razoes profissionais muitas foram as viagens pessoais. Voar passou a ser uma constante na minha vida mas também na vida do meu namorado que me acompanha, da minha família e amigos! Muitas foram as viagens com os meus pais para matarmos as saudades e continuarmos a partilhar novas experiências juntos! E muitas foram as visitas da família e amigos que me encheram o coração! Continuarei a viajar pelo Mundo pois ainda tenho muitos países na lista de destinos! Felizmente, a qualidade de vida que tenho aqui permite-me continuar a alimentar esta paixão e apenas tenho a agradecer por isso!


Uma nova família…
Grande parte dos meus colegas no EMBL também deixaram as suas terras natais para seguirem o seu caminho profissional. Passámos e passamos muitas horas juntos dentro e fora do laboratório. Todos eles se tornaram amigos. Grande parte se tornou família. Família essa que tem sido importante nos dias de sol e alegria mas também naqueles dias mais cinzentos em que o sorriso fica mais desvanecido ou mesmo invisível. Não é fácil. Muitos pensam que a nossa vida de “moderno emigrante” é fácil, principalmente por razões financeiras. Como é natural aqui tenho uma vida que muito provavelmente não poderia ter em Portugal. Mas (e um grande MAS), a componente emocional torna toda esta experiência verdadeiramente agridoce. Muitos são os dias em que a saudade aperta em que me apetece largar tudo e voltar para casa. Voltar para aqueles que mais amo e que tanta falta me fazem. Nesses momentos é bom ter companhia por aqui e felizmente, posso dizer que aqui fiz amigos para a vida.


● Como era a tua vida antes e agora?

Uma “visita” inesperada bateu à minha porta…
Esta família foi verdadeiramente importante a certo ponto. Um ano depois do início do meu doutoramento uma visita indesejável bateu à minha porta. Uma visita que muitos de nós pensamos que nunca vai bater à nossa porta mas apenas à do nosso vizinho. Um linfoma. Cancro. Foi um choque no início. Não sabia o que fazer. “Onde faço o meu tratamento de quimioterapia? Vou para Portugal para poder ter todo o apoio da minha família e amigos ou fico aqui na Alemanha, onde muitos são aqueles que vêm procurar tratamento?” A minha mãe teve a possibilidade de ficar comigo durante todo o tempo do tratamento mas, infelizmente, o meu pai teve que continuar em Portugal a trabalhar visitando-nos regularmente. Foi complicado lidar com todo este cenário numa língua estrangeira e traduzir para os meus pais. Foram dias negros. Foi muita a dor e a tristeza, mas o apoio foi constante e nunca me senti sozinha! Acima de tudo a esperança foi constante. Sempre vi a luz ao fundo do túnel e consegui conquistá-la com o meu sorriso… com a minha vontade de viver! Hoje, olho para trás e vejo o pior e melhor episódio da minha vida. Aprendi a aproveitar todos os momentos, a dar valor às mais pequenas e singelas coisas. Dar valor à vida! O que teria acontecido se estivesse em Portugal? Não sei responder…



Depois da luz ao fundo do túnel, uma vida nova…novos desafios! 
No final deste episódio desta temporada tive que prosseguir para o seguinte. A personagem era a mesma mas a actriz não. Já não era apenas a Diana. Era a Diana que emigrou e a Diana que venceu o cancro. O seguinte episódio consistia em voltar à rotina e colocar mãos à obra. Voltei ao meu projecto e dei início a outras actividades, pois aprendi que a vida não pode ser apenas trabalho. 

Dentro da comunidade portuguesa fiz novas amizades e iniciei um coro juvenil na igreja católica. Foi interessante e muito recompensador partilhar esta experiência com outros jovens portugueses distanciados da “sua casa”. Sempre adorei cantar no chuveiro, no carro… bom… em todo o lado! Cantar faz bem à alma e alegra qualquer um, e em conjunto ainda melhor!


Outra das minhas paixões sempre foi a moda. No entanto, desde que me mudei para a Alemanha que este hobby teve que ficar em stand by. No entanto, certo dia, enquanto estava a fazer o meu tratamento de quimioterapia, vi um anúncio para a eleição da Miss Queen Portugal Alemanha. Nesse preciso momento não estava nem de perto nem de longe com o físico de uma miss, mas como ainda tinha uns meses até à data do concurso decidi inscrever-me. Dia 10 de Junho de 2014 foi o dia do concurso de misses durante a celebração do dia de Portugal na cidade de Hamburgo, uma grande festa com milhares de pessoas! Ainda inchada e careca decidi enfrentar a multidão e mostrar o que uma verdadeira miss deve ser: verdadeira! Apenas tinha o objectivo de transmitir uma mensagem: lutem pelo que vos apaixona e não deixem que nada nem ninguém vos impeça disso! Resultado? Acabei por ser eleita miss simpatia e miss queen Portugal Alemanha! Só me lembro de pensar que havia um erro: “Não é por isto que estou aqui!”. Foi um choque mas também uma alegria pois voltei a sentir-me viva! Com esta eleição vinha também a responsabilidade de vir a representar a comunidade portuguesa na Alemanha na final nacional do concurso. Por motivos de trabalho essa oportunidade aconteceu em Maio do ano passado na qual acabei por ser novamente eleita como miss simpatia. Não ganhei o prémio principal, mas ganhei o carinho e amizade das outras concorrentes. Talvez o melhor prémio de todos!


Apresentar a minha história durante o concurso de misses foi apenas o início de uma missão. Outras foram as ocasiões em que tentei passar uma mensagem motivacional quer por discursos a pequenos públicos ou por pequenas entrevistas. Para além disso senti necessidade de mostrar às pessoas em geral que podemos ser quem quisermos, de que não existem barreiras a não ser aquelas que nós colocamos à nossa frente e principalmente de que não devemos esconder aquilo que somos! Por todas estas razoes decidi partilhar aquilo que um cientista é, mas mais ainda decidi mostrar aquilo que uma mulher cientista é: mulher e cientista. Mulher que pode ser apaixonada pelos mais diversificados mundos como a moda, a culinária a arte e a cientista que trabalha o intelecto na busca de respostas. Este é um dos desafios que pretendo levar avante aqui ou onde quer que o meu destino me espere.

Vejam o vídeo da Diana sobre as mulheres na Ciência aqui


● Prós e contras do país em que estás vs Portugal

O antes, o agora e o depois… 
Desde que vivo na Alemanha que tenho vivido imensas aventuras, tenho aprendido imenso e tenho tido muitas oportunidades que sei que não teria em Portugal. Aqui tenho uma qualidade de vida e uma independência que não teria em Portugal. Aqui tenho muitas coisas boas que não teria em Portugal. Mas chega? A cada dia que passa penso que não… 

A mentalidade dos países da Europa centro e norte é bem diferente do que a nossa. Todos aqui são muito focados no trabalho e nas regras. Tenho que admitir que tem o seu lado positivo e por isso aqui as coisas funcionam bem. No entanto, nem tudo é bom. A nossa capacidade de desenrascar faz imensa falta por aqui! Quer a nível profissional ou quer a nível pessoal se algo corre fora do plano as pessoas aqui “congelam”. Não sinto que tenham capacidade de reacção como nós e principalmente que tenham essa capacidade na falta de matéria-prima! Isso é definitivamente algo que passei a dar muito valor no nosso povo e cultura. 


Saudade. Uma palavra que não tem tradução noutras línguas e que é tão difícil de descrever. Saudade das paisagens, saudade da comida, saudade do sol, saudade da alegria do povo… saudade do meu país e das minhas pessoas! Saudade do nosso Fado! Temos muitos problemas, sim, é verdade! Mas o facto de estar longe lembra-me todos os dias das alegrias que o nosso país maravilhoso nos pode dar. 
Não consigo responder quando, mas certamente que o meu destino será de novo em casa… Por isso, até breve meu Portugal!

 Fotos: Diana Mendes Freire

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